A Palavra Livre de Mortágua
Sábado, 1 de Dezembro de 2007
Museu Salazar
Segue um texto publicado no Jornal Voz do Dão pelo amigo Alberto Andrade, de Santa Comba Dão.
Não podia deixar de o transcrever, pois corresponde em pleno à minha opinião.
- Somos confrontados há algum tempo a esta parte com uma discussão entre opiniões aparentemente imutáveis e inconciliáveis.
Enquanto Santacombadense e Antifascista venho apresentar os motivos que me levam a afirmar-me e a lutar contra a criaão de um Museu a Salazar no meu Concelho:
António de Oliveira Salazar é um personagem incontornável da história recente do nosso país. Deteve directamente o poder durante 38 anos e viu o seu regime prolongado por mais 6 nas mãos de Marcelo Caetano. Assim, não tenho dúvidas quanto à necessidade de se estudar quer o homem (Salazar) quer a obra (regime ditatorial, apelidado de Estado Novo). Para a realização deste estudo torna-se necessária a intervenção de especialista de uma miríade de áreas científicas, que exercerão a sua análise sobre um ainda mais vasto património. Acontece que a totalidade do espólio deste político se encontra depositado na Torre do Tombo, não me parecendo viável a sua deslocalização para o futuro museu de Santa Comba Dão. Podemos então facilmente perceber que tudo o que a Câmara Municipal possui para tão grandioso empreendimento mais não é que um lote de objectos pessoais e envelhecidos, iguais àqueles que temos nos nossos sótãos pertença dos nosso pais e avós. De cientifico; de político; de histórico nada existe na posse do Município.
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Temos assistido nos últimos tempos a uma escalada de tom no discurso da extrema-direita portuguesa. Associado a isto intensifica-se o coro de protestos contra o actual estado da democracia levando alguns a clamar pelo regresso de um Salazar ao poder. Este Salazar por quem o povo clama é um homem de brandos costumes mas de mão firme que saiba dar “uns safanões a tempo”. Como referiu o meu amigo Aurélio Santos: «Os safanões a tempo foram, por exemplo, as balas que mataram Dias Coelho numa rua de Lisboa. Foram as balas que mataram Humberto Delgado na fronteira portuguesa. Os safanões a tempo mataram muita gente no Tarrafal.» É deste Salazar que as pessoas se esquecem. Do torcionário que despachava semanalmente com o Director-Geral da PIDE/DGS. Do ditador que remeteu à fome e à miséria todo um povo com medo de perder o poder. Do tirano que conduziu durante 13 anos uma guerra em África contra o natural desejo de independência dos povos. É este Salazar opressor que uma franja da extrema-direita quer ver renascido. Tivemos já no passado dia 28 de Abril o exemplo daquilo que querem estes grupos de Santa Comba Dão. Um altar. Um local de peregrinação onde possa gritar o seu ódio a tudo e todos. Um local sagrado onde todas as barbaridades que professam sejam válidas e exequíveis.
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O actual executivo autárquico, fazendo bandeira do Museu, afirma que encontrou o caminho para fazer sair o concelho da estagnação económica em que se encontra. Com meia dúzia de postos de trabalho? Neste país que tantos anos viveu amordaçado, onde a cultura era um privilégio de algumas elites, não há ainda o hábito de frequentar museus. Basta olharmos um pouco à nossa volta para percebermos que os museus estão “às moscas”. Como pretende pois, o Sr. Presidente da Câmara, convencer-nos de que este investimento, anunciado em 5 milhões de euros, ao que teremos que juntar mensalmente todas as despesas de funcionamento sendo já certos os 2 mil euros mensais entregues a Rui Salazar de Lucena e Melo, venha potenciar o desenvolvimento do Concelho. A construção de tal museu servirá somente para servir o orgulho do actual executivo. Um executivo que face a esta situação bebe inspiração política no ditador do Vimieiro: “Quero, posso e mando!”. Os únicos no concelho a ver a sua situação financeira melhorada serão aqueles que lá venham a ter emprego, o que muito certamente será feito à semelhança do que é relatado por uma jovem conterrânea nossa numa entrevista ao jornal Público no passado dia 22 de Agosto.
Assim, como Santacombadense e como Antifascista e sem querer entrar em situação de análise política, são estes alguns dos motivos para não querer ver este projecto concretizado.