É dificil chegar lá...
Tendo-se assinalado se no passado dia 3 de Dezembro (Segunda-Feira) o Dia Internacional do Cidadão com Deficiência, decidi escrever-vos estas linhas.
Em 22 de Maio de 1997 é publicado em Diário da República um
Decreto-Lei, o nº 123 desse ano. O primeiro ponto do primeiro artigo desse documento dizia:
«São aprovadas as normas técnicas destinadas a permitir a acessibilidade das pessoas com mobilidade condicionada, nomeadamente através da supressão das barreiras urbanísticas e arquitectónicas nos edifícios públicos, equipamentos colectivos e via pública»
O
Decreto-Lei nº 123/97 entrou em vigor 90 dias após a sua publicação, a 21 de Agosto. Neste documento eram definidas inúmeras normas que se dirigiam ao melhoramento das condições de acesso, desde à largura das passadeiras, à altura dos passeios, à inclinação das rampas de acesso até ao tipo de materiais a utilizar no pavimento, etc.
Com a entrada em vigor desta legislação todos os edifícios que fossem construídos ou alvo de remodelações ou obras deveriam, desde logo, cumprir as novas normas. Era ainda definido o prazo de 7 anos para implementar nos edifícios já existentes as condições de acessibilidade então definidas. Mas os 7 anos passaram e em termos de remoção de barreiras arquitectónicas pouco ou nada se fez.
Perante a inaplicabilidade da lei, o governo de José Sócrates decide avançar com novo documento legislativo. Assim, e em 20 de Abril de 2006, o Conselho de Ministros aprova aquele que será o
Decreto-Lei nº 163/2006, com publicação em Diário da República a 8 de Agosto de 2006.
Esta nova legislação entra em vigor 6 meses depois revogando o estipulado anteriormente e, subitamente, todos aqueles que eram infractores, por não cumprirem as normas de acessibilidade estabelecidas, deixam de o ser. De referir que o estado era, aos olhos da anterior legislação, talvez o maior prevaricador no país. Como solução, o documento agora em vigor vem dar um prazo de adaptação dos edifícios que pode ser de 5 ou 10 anos, consoante tenha sido construído depois ou antes de 1997.
Esta bem visível impunidade leva a que o esforço do estado e do poder local, ao nível das acessibilidades, seja praticamente nulo.
Na sede de concelho assistimos, numa das raras e cegas aplicações da lei, ao rebaixamento dos passeios nos locais com passadeiras. Cega porque foram deixados no centro da vila alguns canais intransponíveis para um deficiente motor. Exemplo disso é o local onde a Avenida Dr. José Assis e Santos é interceptada pela Rua de Aveiro, local que não possui uma única passadeira nem nenhum passeio rebaixado. Tentem, em jeito de exercício, os senhores responsáveis pelo ordenamento urbano atravessar em cadeira de rodas, claro, do fundo da “ladeira do hospital” até junto à antiga Casa Xalo.
Mas não só na ausência de condições ou equipamentos se pautam as dificuldades de um deficiente motor. Temos o caso da Caixa Geral de Depósitos e do seu pomposo elevador. Bem pensado, adequado, lindo… mas para que funcione é necessário activá-lo com uma chave que é necessário requisitar no interior.
Continuando na banca, só o Banco Internacional do Funchal é acessível a um deficiente motor. Refira-se que não por seu mérito e só graças a um pequeno passeio em torno do jardim do prédio onde este se encontra.
É neste local e no supermercado Feirão que temos as únicas caixas multibanco acessíveis. Devido ao seu acesso estar condicionado pelo horário de funcionamento do EcoMarché podemos excluir a caixa que lá se encontra. Assim somente duas caixas acessíveis num total de 7, e ainda assim com uma altura em relação ao chão que impossibilita que alguém numa cadeira de rodas possa utilizá-las.
Mas não se queda por aqui este triste rosário. Câmara Municipal, Estação dos CTT, serviço local de Segurança Social, Escolas, uma das duas farmácias da Sede de Concelho, Estação Ferroviária, Juntas de Freguesia e muitos, muitos outros. Todos edifícios sem possibilidade de acesso a deficientes motores. Juntamos ainda passeios subdimensionados, alguns devido a estacionamentos invasivos, ausência de parques de estacionamento adequados, mobiliário urbano desajustado, ausência de passadeiras…
E não só os deficientes motores encontram dificuldades. No caso dos deficientes visuais a falta de sinalética e adequação às necessidades especiais é quase total.
É por certo imenso o rol de normas a aplicar, mas desta vez tem-se 10 anos para o fazer. É de esperar que não seja necessária nova legislação com novos prazos e com tudo a começar outra vez do nada.