O Orçamento para 2009 da Câmara Municipal de Mortágua foi tornado público vai já para 15 dias. Foi nesta altura que a população do concelho tomou, pela primeira vez, contacto com este que é um dos mais importantes documentos para a gestão de qualquer município.
Apesar de haver melhorias no que toca à democratização do acesso a este e outros documentos, a Câmara de Mortágua tem ainda um longo caminho a percorrer. Apesar de o ano de 2009 ser o terceiro ano para o qual estão disponíveis os documentos de previsão de contas e as Opções do Plano, estes encontram-se disponíveis tão só na sua versão original. Todas as alterações se mantêm como que no segredo dos deuses.
O que o actual executivo autárquico faz mais não é que jogar areia para os olhos do povo através da divulgação dum documento que rapidamente deixa de estar actualizado. Esta desactualização é facilmente perceptível através dos documentos de prestação de contas, onde podemos ver que os valores aí apresentados como orçamentados em cada rubrica não correspondem aos que existiam no início do ano. Essas alterações são normais, no entanto o Orçamento disponibilizado ao público, inclusive o publicado no site da câmara, deveria ser alterado de forma a corresponder à nova realidade.
Toda a própria apresentação deste documento assenta numa política de “terra queimada”, bastante comum ao executivo que há quase 20 anos governa os nossos destinos. O Orçamento é apresentado já na sua forma final e como panaceia para a nossa existência. A veleidade dum pequeno grupo de trabalho ao julgar que pode sem margem para dúvidas idealizar o “melhor caminho” para o Concelho é no mínimo digna de Narciso. Ao longo destas duas décadas tudo nos é apresentado como já feito, já escolhido e já decidido. A participação permitida à generalidade dos munícipes é a de 4 em 4 anos colocar o seu voto na urna eleitoral. A contrastar esta realidade e a título de exemplo de outras práticas possíveis podemos referir a elaboração de orçamento participativa, na qual é dada a possibilidade a todos de se manifestarem quanto ao orçamento antes de este ser aprovado, dizendo que este processo é já prática em alguns dos concelhos do nosso país.
Para 2009 o Orçamento Municipal sofre um aumento de perto de 3 milhões e meio de euros. Este aumento fica a dever-se exclusivamente à construção do novo Centro Educativo. Não discordando que é esta uma obra necessária, especialmente para as crianças do nosso Concelho, não podemos também deixar de considerar que temos de olhar para ela como um anexo no que toca à análise do documento previsional de contas, pois obras desta envergadura não são realizadas todos os anos. A comparação deste orçamento com os dos anos anteriores só pode ser feita se subtrairmos essa despesa excepcional, e as receitas a ela associadas, aos valores totais. Dos mais de 13 milhões e meio de euros orçamentados 4,6 milhões, cerca de uma terça parte, são destinadas ao Centro Educativo. O aumento na parte das receitas inscrito no orçamento e que pode ser imputado a esta obra é de 2 milhões e meio de euros.
Ao analisarmos o Orçamento, agora despojado do aumento verificado pela opção do Centro Educativo, verificamos que o seu crescimento é residual. Sem o aumento provocado pela aposta na grande obra de 2009 o Orçamento deste ano é superior ao do ano passado tão só em 26 mil euros. Para os que julguem que essa conta não se pode fazer assim é então de referir que o aumento na previsão da receita entre 2008 e 2009 se fica a dever em 79% (quase 3 milhões de euros) as aumento das transferências do estado relacionadas directamente com o Centro Escolar. Os restantes 21% deste aumento ficam a dever-se a um aumento esperado de mais de 100 mil euros em taxas relacionadas com Loteamentos e Obras; mais 115 mil euros em rendas cobradas pela Câmara à EDP e à Águas do Planalto (da qual entre 2004 e 2007 não se cobrou num tostão, resta esperar a aprovação das contas de 2008 para ver se continua assim); um aumento de 35 mil euros (26%) referentes aos resíduos sólidos, passando assim cada família mortaguense a pagar mais perto de 10€ por ano pela recolha do lixo. A grande fatia deste aumento prende-se com a venda dos terrenos do loteamento da cerâmica, totalizando-se na venda de terrenos um aumento de 400 mil euros.
Mas depois de visto na generalidade devemos também olha com mais atenção algumas rubricas do Orçamento, das Opções do Plano e do texto introdutório a estes dois documentos.
O Orçamento divide-se em duas grandes despesas: a Despesa Corrente e a Despesa de Capital. Entende-se pela primeira a despesa relacionada com o funcionamento interno da Câmara, e com a segunda a despesa relacionada com investimentos, infra-estruturas e outras mais-valias duradouras para o concelho.
Para 2009 há previsto € 4,975,571 de Despesa Corrente e € 8,696,000 de Despesa de Capital. No entanto se considerarmos que toda a rubrica das obras leva um aumento de mais de 4 milhões de euros face ao ano anterior, ficamos com uma Despesa Corrente de sensivelmente 4,7 milhões de euros. Nesta situação os pesos das Despesas Corrente e de Capital alteram-se de 36%-64%, respectivamente, para 52%-48%. Assim, mais de metade do orçamento regular para 2009 é destinado ao funcionamento interno da máquina autárquica.
Outra das grandes questões que saltam à vista é o aumento em 5% (cerca de 120 mil euros) das despesas com pessoal. Desses 5% teremos o aumento de ordenados da função pública que corresponde a 2,9%. Sobram assim cerca de 70 mil euros para os perto de 200 mil euros de despesas com os funcionários absorvidos do ministério da educação devido à transferência de competência protocolada entre a Câmara e o Ministério da Educação.
Para este aumento de despesas com pessoal a autarquia reserva no texto de Apresentação do Orçamento um pequeno parágrafo em que se diz que essa rubrica pode crescer. No entanto no Mapa de Pessoal para 2009 já estão contempladas essas transferências de pessoal bem como o índice remuneratório de cada um. Assim a despesa inerente às remunerações destes novos 39 funcionários autárquicos poderia desde logo ter sido calculada e incluída no Orçamento para 2009. Será, claro, incluído numa revisão do orçamento que não chegará aos olhos do público, como hábito.
No orçamento ainda referir que 8% e 22%, respectivamente das rubricas de Aquisição de Bens de Capitais e de Aquisição de Bens e Serviços, não são despesas definidas. Este milhão de euros não tem despesa definida podendo assim ser utilizado de acordo com parâmetros que não são do conhecimento público.
No global pode entender-se deste ser um Orçamento de contenção. Entende-se esta cautela face à dimensão financeira da obra que apresenta o Centro Educativo. Se bem que o aumento de 10% pelo segundo ano consecutivo da orçamentação da Festa da Juventude não se coadune com a austeridade apregoada na frase de abertura da apresentação. Talvez as actividades políticas que se avizinham em Outubro próximo o ajudem a entender. De recordar que a última vez em que esta rubrica sofreu um aumento significativo foi em 2005, tendo neste ano a verba orçamentada para a Festa da Juventude sido 150% superior à de 2004. Esta festa viu em 4 anos triplicar a sua orçamentação.
Ainda assim não perde a autarquia a possibilidade de anunciar «18 medidas de apoio e incentivo às famílias e empresas». Este anuncio traz-me à memória um livro escrito faz 60 anos por George Orwell. 1984 de seu título, este livro versava entre outras coisas sobre os sucessivos anúncio de propaganda do sistema, grande parte das vezes contraditórios. Mas como o povo tem memória curta a mensagem era dada com certeza e convicção criava uma nova percepção de realidade.
Assim, destas 18 medidas anunciadas, convém salientar que 9 delas correspondem a programas que transitam já de anos anteriores: Isenção de taxas de construção aos jovens; redução do IMI; participação de 2,5% no IRS; isenção de taxas de edificação para empresas que criem 5 ou mais postos de trabalho; não aplicação da taxa municipal do direito de passagem; bolsas de estudo; Unidade Móvel de Saúde; Cabaz de Natal. Sobejam então só metade de novas medidas.
Podemos ainda encontrar neste Orçamento e Opções do Plano uma revisão do PDM que arrasta desde há pelo menos 6 anos, um Estudo de Mobilidade com também pelo menos 6 anos. Destas duas rubricas nada se sabe que tenha acontecido. Surgirão talvez este Plano e este Estudo já terminados garantindo-nos ser o que de melhor se podia fazer, mas sem no entanto preocupação em auscultar os munícipes.
Como alguém já disse “os orçamentos não são nem maus nem bons, as políticas é que são”. É esperar para ver como irá o executivo aplicar o orçamento.
Ficam aqui os documentos envolvidos nesta análise:
2008 Orçamento
2009 Orçamento
Anti-Fascismo
Lutas
Blogs Camaradas
PCP