A Palavra Livre de Mortágua

Sexta-feira, 7 de Maio de 2010
Estórias do Maio

Havia um carpinteiro que trabalhava na sua pequena carpintaria. Fazia mesas, cadeira, bancos, armários, portas... enfim, de tudo um pouco.

Certo dia um sujeito bem apresentado, acabadinho de sair duma qualquer universidade, entra pela sua modesta carpintaria dentro:

"Corre bem o negócio?" – perguntou ao carpinteiro.

"Não me posso queixar. Muito trabalho, a coisa vai andando."

"E quem lhe trata dos papeis? Contas, encomendas, fornecedores e isso tudo." – torna a perguntar o estranho.

"Sou eu, pois então! Ao fim do dia"

O estudado universitário elucidou o carpinteiro sobre as vantagens de ter alguém que se preocupasse com a gestão do seu negócio, dando-lhe assim mais tempo para se dedicar à sua arte. Que estava precisamente à procura de emprego na área de gestão. Após uma conversa o carpinteiro acede a contratar o gestor.

Algum tempo passado o gestor da modesta carpintaria conclui que talvez contratar um vendedor não seria pior. Pois assim o carpinteiro trataria da produção, o gestor da gestão e um vendador garantiria a existência de encomendas.

Visto todos eles estarem ocupados nas suas funções, a contratação dum funcionário administrativo que tratasse do expediente diário revelou-se uma necessidade.

Com uma empresa em fraca expansão e com o aumento da complexidade do processo contabilístico a prossegui-se para contratação dum guarda-livros.

Seguiram-se administrativos e gestores a um ritmo acelerado pois a empresa ia em franca expansão.

E o carpinteiro cada vez mais livre para se dedicar às suas cadeiras, portas e armários.

Como não há fartura que não dê em miséria os tempos começaram a apertar, e os lucros a descer.

Havia que fazer economias.

Uma consultoria externa, daquelas efectuadas por especialistas bem pagos, concluiu que a carpintaria devia reestruturar-se. E assim foi.

Após analisada a estrutura desta empresa conclui-se que era o carpinteiro o empregado menos qualificado, como tal o mais natural de ser substituído. E assim fizeram.

Toca de despedir o carpinteiro.

Sem carpinteiro a empresa ficou sem produção e, claro, fechou.

 

Esta estorieta demonstra bem o funcionamento da "economia moderna".

O carpinteiro continuou a produzir objectos da sua arte, tal como fazia antes. Mas todo a máquina artifical que lhe montaram em volta, e que mais não fazia que sustentar-se do seu trabalho, acabou por ser tão grande que acabou com todo o negócio.

No "mundo real" as empresas vêem o seu valor na Bolsa subir e descer sem que o seu ritmo de trabalho se altere. Porque deve uma fábrica ver o seu valor descer ou subir na Bolsa de Valores se os seus empregados continua a trabalhar de manhã à noite e a produzir a mesma quantidade de carros, ou rolhas, ou pares de calças, ou seja lá o que for?

Só há uma razão para isso acontecer. É alguém estar a brincar com o dinheiro gerado pelos trabalhadores quando desempenham o seu ofício. Porque é o trabalhador que gera riqueza.

São os trabalhadores da construção civil que constroem as fábricas.

São os trabalhadores da área da mecânica que montam as máquinas que esta precisa.

São os trabalhadores fabris que operam as máquinas desta fábrica.

São os trabalhadores da expedição que empacotam e remetem ao cliente as mercadorias produzidas.

São os trabalhadores dos transportes que levam as mercadorias ao seu destino.

São os trabalhadores dos comércios que vendes estes produtos fabris.

E por fim, são todos estes trabalhadores que, com os salários conseguidos do seu trabalho, vão às lojas e compram estes produtos.

O elo comum a toda a cadeia é o trabalhador. O elo final de toda a cadeia é o trabalhador. É ele na sua situação de consumidor final que paga por todo o processo.

Se retirarmos poder de compra aos trabalhadores, através da não valorização dos seus salários, estes enquanto consumidores deixam de poder comprar. Os comércios deixam de vender, por isso deixem de encomendas, por isso não há necessidade para transportar mercadorias. Se não há encomendas não há trabalho na expedição de encomendas da fábrica nem trabalho para os operários fabris. Se não há trabalho para estes não há necessidade de construir novas máquinas nem novas fábricas.

Por fim só quero deixar uma questão: quando deixarmos de ter dinheiro para comprar os produtos produzidos nas nossas fábricas, para quem produzem elas esses produtos?


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Sexta-feira, 26 de Março de 2010
Os Velhos

Les vieux ne parlent plus ou alors seulement parfois du bout des yeux

(Os velhos não falam mais ou então somente por vezes do fundo dos olhos)

Même riches ils sont pauvres, ils n'ont plus d'illusions et n'ont qu'un cœur pour deux

(Mesmo ricos são pobres, não têm mais ilusões e não têm mais que um coração para dois)

Chez eux ça sent le thym, le propre, la lavande et le verbe d'antan

(Em sua casa cheira a tomilho, a limpo, a lavanda e ao pretérito perfeito)

Que l'on vive à Paris on vit tous en province quand on vit trop long temps

(Ainda que vivamos em Paris vivemos todos na provincia quando vivemos muito tempo)

Est-ce d'avoir trop ri que leur voix se lézarde quand ils parlent d'hier

(E é de terem rido muito que as suas vozes se amargam quando falam d’ontem)

Et d'avoir trop pleuré que des larmes encore leur perlent aux paupières

(E de ter chorado muito que as lágrimas ainda brilham como perolas nas suas palpebras)

Et s'ils tremblent un peu est-ce de voir vieillir la pendule d'argent

(E se treme um pouco é por ver envelhecer o pendulo do relógio de prata)

Qui ronronne au salon, qui dit oui qui dit non, qui dit: je vous attends

(Que ronrona na sala, que diz sim que diz não, que diz: espero-vos)

Les vieux ne rêvent plus, leurs livres s'ensommeillent, leurs pianos sont fermés

(Os velhos não sonham mais, os seus livros estão ensonados, os seus pianos fechados)

Le petit chat est mort, le muscat du dimanche ne les fait plus chanter

(O pequeno gato está morto, o mascate de domingo já não os faz cantar)

Les vieux ne bougent plus leurs gestes ont trop de rides leur monde est trop petit

(Os velhos não se mexem mais os seus gestos têm muitas rugas e o seu mundo é muito pequeno)

Du lit à la fenêtre, puis du lit au fauteuil et puis du lit au lit

(Da cama à janela, depois da cama à poltrona e depois da cama à cama)

Et s'ils sortent encore bras dessus bras dessous tout habillés de raide

(E se saiem ainda de braço no braço todos engomados)

C'est pour suivre au soleil l'enterrement d'un plus vieux, l'enterrement d'une plus laide

(É para acompanhar ao sol o funeral d’um ainda mais velho, o enterro duma mais feia)

Et le temps d'un sanglot, oublier toute une heure la pendule d'argent

(E o tempo d’um soluço, esquecer a toda a hora o pendulo de prata)

Qui ronronne au salon, qui dit oui qui dit non, et puis qui les attend

(Que ronrona na sala, que diz sim que diz não, e depois que os espera)

Les vieux ne meurent pas, ils s'endorment un jour et dorment trop long temps

(Os velhos não morrem, deixam-se dormir um dia e dormem por muito tempo)

Ils se tiennent par la main, ils ont peur de se perdre et se perdent pourtant

(Têm-se pela mão, têm medo de se perder e perdem-se na mesma)

Et l'autre reste là, le meilleur ou le pire, le doux ou le sévère

(E o outro fica lá, o melhor ou o pior, o doce ou o severo)

Cela n'importe pas, celui des deux qui reste se retrouve en enfer

(Isso não importa, aquele que resta fica num inferno)

Vous le verrez peut-être, vous la verrez parfois en pluie et en chagrin

(Talvez o venham a ver, irão vê-lo algumas vezes na chuva e na tristeza)

Traverser le présent en s'excusant déjà de n'être pas plus loin

(A atravessar o presente já a desculparem-se de não estarem já mais longe)

Et fuir devant vous une dernière fois la pendule d'argent

(E fugir diante de vós uma última vez o pendula de prata)

Qui ronronne au salon, qui dit oui qui dit non, qui leur dit : je t'attends

(Que ronrona na sala, que diz sim que diz não, que lhes diz: espero-te)

Qui ronronne au salon, qui dit oui qui dit non et puis qui nous attend.

(Que ronrona na sala, que diz sim que diz não e depois que nos espera)

 

O texto acima, em tradução livre do francês, é a letra duma música de Jaques Brel. Descreve a velhice, dos que já são velhos e dos que serão velhos amanhã, pois o relógio de prata não para e tem paciência para esperar por nós todos.

Tive recentemente conhecimento de que a câmara pretende vender o Edifício da Escola Primária de Trezoi. Esta venda surge como facto consumado sem nunca se ter dado à discussão uma outra alternativa.

Construida há mais tempo do que muitos de nós se lembrarão este foi um edifício que esteve sempre ao serviço da população de Trezoi e das aldeias vizinhas. E é ao uso do povo que deve ficar. Isto não só em relação à escola de Trezoi, onde estudou também grande parte da minha familia. Onde aprenderam a ler e a escrever, a somar e subtrair. Onde aprenderam os nomes das serras e dos rios. Onde começaram a aprender a serem Mulheres e Homens, a ser Cidadãos Portugueses. Mas em relação a todas as outras Escolas do nosso Concelho, onde estudámos todos nós. Foi ainda nessas Escolas que aprendemos que a sociedade é um todo. Que tudo interage com tudo. Que aprendemos a História e a continuidade. Que aprendemos a viver juntos e a olhar uns pelos outros.

A típica Escola Primária Portuguesa é um edifício de paredes sólidas, construído em regra num local alto e soalheiro, virado a sul para optimizar a exposição solar. São em regras rodeadas por um generoso pátio. Claro que no geral a construção deixará alguma coisa a desejar face aos edifícios modernos, principalmente no que toca à capacidade de isolamento térmico. Mas nada que pouco a pouco, escola a escola, não se pudesse resolver.

O Concelho de Mortágua é, como infelizmente já disse várias vezes, um dos mais envelhecidos a oeste do maciço da Serra da Estrela. Claro que temos alguns serviços de suporte aos nossos velhos, que tão queridos nos são, avós e avôs de todos nós. Mas tudo o que possamos fazer por aqueles que nos trouxeram ao mundo e criaram será pouco.

Todas estas escolas, entre um milhão de outras coisas, podiam ser reconvertidas em centros de dia, entregues à associações locais. Há concelhos bem próximos do nosso em que os Centos de Dia existem em quase todas as aldeias, o de Tábua por exemplo. A criação destes Centros de Dia permitiria que os velhos não tivessem mundos pequenos entre a cama, a janela, a cadeia e a cama, como nos diz o Brel.

Permitia criar pontos de encontro onde juntos tivessem o seu almoço, na mesma distribuido pelos serviços sociais patrocinados pela Autarquia, ao invés de o fazerem isolados no seu mundo pequeno.

Permitia a criação de postos de trabalho, pois seria preciso quem os acompanhasse. Não só nas suas refeições mas também na organização de actividades lúdicas. Que os ajudassem na limpeza das suas casas e roupas, tarefas que começam a pesar à medida que os seus movimentos se enchem de rugas.

E quão maravilhoso é rodearmos-nos dum grupo desses Senadores da nossa sociedade e ouvir as suas vozes roucas, ver as pérolas nas suas pálpebras, acordar os seus livros e abrir os seus pianos. E sobretudo evitar que se limitem a esperar na chuva e na tristeza que o pêndulo de prata deixe de dizer sim e dizer não para eles.

Devemos-lhes isso. Manter viva a chama que durante tantos anos iluminou as suas aldeias. Devemos-nos isso.

Aos ilustres membros da Câmara Municipal de Mortágua tenho a pedir que não vendam a Escola de Trezoi. Não vendam nenhuma das Escolas.

As Escolas são nossas. De nós todos. Ponham-nas ao nosso uso. E se não soubermos como o fazer, então tratem de nos ensinar. Pois é também essa a vossa função: ensinar-nos a ser melhores cidadão.


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Sexta-feira, 23 de Janeiro de 2009
Férias e Feriados

No dia 3 de Dezembro o Jornal de Notícias fazia capa com o título “Trabalhadores param um terço do próximo ano”. Nesse artigo dizia-se que o ano de 2009 é altamente propício às pontes e fins-de-semana prolongados. Antes de prosseguir devo referir que o presente texto não tem em conta os feriados municipais.

Mas vamos lá aos factos.

Em 2009 o trabalhador português vai trabalhar 226 dias. De facto menos um dia que em 2008 e que em 2010. Mas igual ao que trabalha em 2007, 2011, 2012 e 2013. E mais um dia que em 2006 e 2014. Em boa verdade os trabalhadores não param um terço do ano (33%), mas sim 38%. Param 139 dias. E porque param os trabalhadores tanto tempo?

São 104 os dias de fim-de-semana, pois há 52 semanas e, como tal, 52 sábados e 52 domingos. É assim todos os anos. De férias, o trabalhador tem direito a 25 dias. Mais uma vez todos os anos é igual. E já vamos em 129 dias.

Os 10 dias que faltam para os 139 são os 10 feriados que calham em dia de semana em 2009. São em igual número aos de 2007, 2008 e 2010. São menos do que em 2006 e 2012, que têm 11 feriados à semana. Se considerarmos que os anos 1909 e 2109 (um hiato que compreende 100 anos para trás e 100 para a frente de 2009) verificamos que em 116 desses anos houve 10 feriados à semana, portanto mais de metade. Houve ainda 29 anos com 9 feriados à semana e 56 com 11.

Depois versa o articulista sobre a quantidade de pontes que este ano permite. Por pontes entende-se o feriado que calha à 3ª ou 5ª-feira, o que permite ao trabalhador ter 4 dias de repouso. No próximo ano temos 5 feriados nestas condições. Mas facilmente podemos ver no calendário de 2008 que a situação é igual. E em 2007, em 2006, em 2005, em 2004… pronto em 1999 houve só 4 feriados assim, e antes disso em 1993, 1988, 1971… dá para perceber a ideia. Está bem! Admito que para o ano também só há 4. Mas depois esta situação só se repete em 2015, 2021, 2027, 2038… Em boa verdade se diga que no mesmo período de referência utilizado antes (1909 a 2109) verificamos haver 29 anos com 4 possibilidades de ponte. Todos os outros, repito TODOS, tem 5 feriados a uma 3ª ou 5ª.

Mas continua o texto a divagar sobre os fins-de-semana prolongados. Vamos aos números. Para o mesmo período de referência: 86 anos com 3 feriados, 59 com 4 e 56 com 5. E já agora feriados à 4º-feira: 115 anos com 1 e 86 com 2. De salientar que nos 86 anos com 2 feriados à 4ª há sempre só 3 fins-de-semana prolongados. Para quando o número de fins-de-semana com sabor a férias é de 4 ou 5, há um só feriado à 4ª.

Relativo ao ano de 2009 podemos ver que temos 4 fins-de-semana estendidos. Em termos comparativos: mais um que em 2007, 2008 e 2010. Igual a 2004, 2005 e 2011. E um a menos que em 2006 e 2012.

Quanto à ideia de que as pontes roubam produtividade resta-me dizer que se os trabalhadores fazem pontes é porque utilizam um dos seus dias de férias, daqueles 25 a que têm direito. No caso da tolerância de ponto, é de referir que se esta existe é porque a entidade patronal assim o decide.

Por fim só deixar aqui a quantidade de feriados e dias de férias de alguns países da nossa Europa unida.

Feriados: Holanda – 10; Reino Unido – 11; Luxemburgo – 12; Alemanha – 13; Dinamarca, Espanha, França, Itália e República Checa – 14; Bélgica – 16; Áustria e Noruega – 17; Suécia e Suíça – 19.

Férias: Reino unido – 28 dias; Suécia – ente 25 e 32 dias, dependendo da idade; França – 25 a 35 dias; Alemanha, Áustria e Noruega com 25 dias, como o nosso caso.

Em nota de rodapé só me resta desejar boa sorte à Suécia onde os «malandrões» dos trabalhadores param 43% do ano. Não perceberão os trabalhadores de lá que têm que trabalhar mais para aumentar a sua qualidade de vida? Mas… esperem um pouco… a Suécia tem de facto uma grande qualidade de vida, uma das melhores do mundo até. Deixo esta pequena chalaça à vossa consideração.


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Segunda-feira, 12 de Maio de 2008
1º de Maio

Este texto era suposto ser dado à estampa na Defesa da Beira em 2 de Maio e depois em 9 de Maio... Vem um pouco atrasado, mas julgo que sempre actual.

 


 

Dia Internacional do Trabalhador
No dia 1 de Maio de 1886 mais de 500 mil trabalhadores iniciam protestos em Chicago para exigir uma redução, de 16 para 8 horas, na jornada de trabalho. Nos dias que se seguiram a polícia carregou contra os manifestantes provocando vários mortos e centenas de feridos.
Robert Owen havia, já em 1810, instituído a jornada de trabalho de 10 horas nas suas empresas. E passados 7 anos reduziu este tempo para as 8 horas, argumentando que o trabalhador deveria ter 8 horas para trabalhar, 8 para lazer e família e 8 para descansar.
Com este exemplo, trabalhadores de todo o mundo começaram a reivindicar a jornada de oito horas. Em 1866, em Genebra, a Primeira Internacional decreta como bandeira de luta as oito horas de trabalho. Luta que levaria à situação de Chicago.
Em 1889 a Segunda Internacional decretou, em memória dos operários de Chicago, o dia 1º de Maio como dia de luta universal pelos direitos laborais:
«Institui-se uma grande manifestação internacional numa data fixada de uma vez para sempre, de modo a que em todos os países e em todas as cidades, simultaneamente, neste dia, os trabalhadores exijam dos poderes públicos que a jornada de trabalho seja reduzida para oito horas e que se cumpram todas as restantes decisões do congresso da Internacional…»
Desde então este dia é celebrado por todo o mundo como sendo o Dia Internacional do Trabalhador.
Em Portugal, durante os negros anos do fascismo, a celebração do 1º de Maio era proibida. Mas não foi esse motivo suficiente para impedir que em 1962 mais de 100.000 trabalhadores se tenham manifestado em Lisboa. Com o fim do fascismo, a 25 de Abril de 1974, foi possível aos trabalhadores comemorarem livremente o seu dia. Poucos dias após a Revolução dos Cravos as forças progressistas, há muito amordaçadas, conseguiram organizar uma gigantesca manifestação que reuniu mais de meio milhão de pessoas.

 

Direitos dos Trabalhadores
Além da jornada de trabalho de 8 horas, são muitos mais os direitos dos trabalhadores. Muitos deles esquecidos e ignorados.
Assim, todos os trabalhadores:
• Têm a jornada diária com o limite de 8 horas, e um máximo de 40 horas semanais;
• Têm o direito a 2 dias úteis de férias por cada mês de trabalho, não se contabilizando como dias de férias os Sábados, Domingos e Feriados, ainda que neste o trabalhador trabalhe;
• Têm o direito a ter como remuneração do seu trabalho nunca menos que o ordenado mínimo nacional (€426), respeitando-se o estipulado nos Contratos Colectivos de Trabalho nomeadamente no que toca a diuturnidades e promoção de categoria profissional, com reflexo no ordenado, de acordo com a experiência adquirida;
• Têm o direito a ver remuneradas as horas de trabalho extraordinárias de acordo com o estipulado pela lei (50% e 75% pela primeira hora extra e seguintes, 75% e 100% pela primeira hora extra nocturna e seguintes);
• Têm o direito a estar sindicalizados sem que por isso sejam prejudicados nas suas carreiras profissionais.
A estes podemos ainda juntar, por exemplo, os direitos relativos à assistência médica a familiares e os direitos definidos no estatuto de trabalhador-estudante, e ainda o direito a não ser “pau para toda a obra” nas mãos do patronato.
 

Melhoria das condições sociais
Apresentados como grandes soluções para o nosso concelho, recebemos o anúncio da construção de uma auto-estrada e vemos inaugurado o ninho de empresas.
Colocando as minhas reticências (que sinceramente espero erradas) quanto à viabilidade de tais projectos e enquanto impulsionadores da qualidade de vida local devo afirmar que não são estes os projectos fundamentais.
O que interessa mudar em Mortágua é a mentalidade de alguns patrões quanto ao trabalho e aos trabalhadores. Basta afirmar que há, na nossa sede de concelho, comerciantes que não pagam sequer o ordenado mínimo aos seus funcionários. Outros que não aumentam os ordenados dos seus empregados, alguns há mais de 5 e 6 anos. Existe uma quantidade significativa de trabalhadores sem qualquer espécie de vínculo laboral e, em consequência, sem Segurança Social nem direito ao subsídio de desemprego. Trabalhadores que trabalham quase de sol a sol, ficando com pouco ou nenhum tempo de sobra para as suas vidas pessoais, sem verem remunerada uma única hora extraordinária.
Temos ainda a situação de empregados que recebem mais do que aquilo que é declarado, poupando assim ao patrão encargos relacionados com os ordenados pagos. Acontece que esse funcionário, necessitando de recorrer ao apoio social (doença, gravidez, desemprego, reforma) vê a prestação recebida ser calculada em função do valor de ordenado declarado e não em função do valor realmente recebido.
No sector industrial há (pelo menos) uma unidade fabril no nosso concelho com funcionários a receber pouco mais de metade do ordenado mínimo.
No sector da exploração florestal há ofertas de trabalho, veiculadas inclusive pelo IEFP, para a realização de 56 horas semanais por uma remuneração de 500 euros mensais. Ainda neste sector é enorme a quantidade de trabalhadores sem contrato de trabalho, e sem o cumprimento dos mais básicos requisitos sociais.
Claro que facilmente percebo que não é fácil o tempo em que vivemos. Mas para um Concelho poder progredir é necessário haver estabilidade social. E é necessário haver poder de compra. Como pode um jovem casal de operários, com um rendimento mensal comum de 1000 euros, aspirar à compra de um apartamento que no nosso concelho custa nunca menos de 100.000 euros?
O resultado é a continuação da sangria de jovens para os concelhos limítrofes e para as grandes cidades.
 

Última nota: 25 de Abril
É com algum pesar que vejo, na agenda municipal de Abril, o anúncio de uma auto-estrada tomar o espaço normalmente, nesta altura, reservado a uma reflexão sobre o 25 de Abril.
Se esta auto-estrada é possível, se o poder local pode vangloriar-se do resultado dos seus esforços para a obter, se o pode inclusive fazer numa publicação própria sem o prévio escrutínio do lápis azul, tudo isso é graças a um grupo de homens que durante 48 anos não abdicou de lutar contra a ditadura. E esse grupo de homens, junto com os Capitães de Abril, devem ser lembrados todos os anos. Até para não cairmos no erro de nos esquecermos deles e um dia começarmos a comemorar um outro 25…


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publicado por Mário Lobo às 09:15
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Domingo, 11 de Maio de 2008
Barcos Gregos

Em Dezembro de 1985 sai o album "Cerco" dos Xutos & Pontapés.

Nesse album há uma música que fala de um certo sufoco: "falta-me o ar, falta-me emprego para cá ficar".

Diz-nos agora, mais de 22 anos volvidos, a OCDE que o número de emigrantes portugueses aumentou 52,6% entre 2000 e 2006.

 

 


 

Barcos Gregos

 

Já estou farto de procurar
Um sítio para me encaixar
Mas não pode ser
Está tudo cheio, tão cheio, cheio, cheio
Mas o que é que eu vou fazer
Eu vou para longe, para muito longe
Fazer-me ao mar, num dia negro
Vou embarcar, num barco grego
Falta-me o ar, falta-me emprego
Para cá ficar
Já estou farto de descobrir
Tantas portas por abrir
Mas não pode ser, é tudo feio, tão feio, feio
Mas o que é que eu vou fazer
 

 


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publicado por Mário Lobo às 11:23
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Quinta-feira, 20 de Dezembro de 2007
A produtividade, ora aí está...

Fomos há não muito tempo confrontados, na imprensa nacional, com a notícia de que os trabalhadores do nosso país só iriam trabalhar um terço dos dias de 2008. O que é a mais completa mentira. Os portugueses vão trabalhar 226 dias, o que corresponde a pouco mais de metade dos dias do ano, ou seja 62% dos dias. E isto porque é ano bissexto. Senão só trabalhariam 225 dias. Quer dizer que cada português vai ter na realidade 140 dias de descanso.

Ao ser anunciada esta grande “descoberta” o patronato e algumas forças políticas a ele mais ligadas não perderam tempo em apontar este excesso de dias de repouso como causa da fraca evolução da nossa economia.

Aponta-se o dedo às famosas pontes. Intentam-se manobras para que os feriados sejam celebrados junto aos fins-de-semana, às segundas ou sextas. Há ainda os que, julgando ver todo o mal da economia no pouco tempo de trabalho dos portugueses, lutam para que estes sejam banidos do calendário português.

Mas vamos então ver de onde vêm os 140 dias, esse “astronómico” número:

1.       Havendo 52 semanas no mês, há também 52 fins-de-semana; 52 Sábados e 52 Domingos. Portanto temos aqui 104 dias.

2.       Em seguida devemos somar os 25 dias úteis de férias a que os trabalhadores portugueses têm direito. Temos 129 dias.

3.       Por último devemos adicionar a mais “ignóbil” das parcelas, os feriados. Em Portugal temos 14 feriados nacionais. Destes, no próximo ano, 11 são à semana. E temos os nossos 140 dias.

Talvez seja também de verificar o número de dias de férias que têm outros países da nossa Europa. De acordo com os argumentos de quem acha que os portugueses trabalham pouco, seria lógico que nos países com uma economia mais dinâmica e saudável os trabalhadores tenham menos dias de férias. Assim temos:

·         Reino unido: 28 dias;

·         Suécia: ente 25 e 32 dias, dependendo da idade;

·         França: 25 a 35 dias;

·         Por último a Alemanha, Áustria e Noruega com 25 dias, como o nosso caso.

Há claro países com menos dias de férias, como o caso da Bélgica e da Holanda com 20 dias. Mas ainda assim podemos seguramente afirmar que não existe uma relação directa entre a produtividade (ou falta dela) e o número de dias de férias.

Mas voltando às pontes e aos feriados. Parece que este ano são mais. Ou melhor, que são mais à semana, especialmente à 3ª e 5ª feira, o que os torna apetecíveis para as pontes.

Uma simples consulta aos calendários dos últimos anos permite-nos ver que teremos em 2008 tantos feriados à 3ª e 5ª como em 2007; a saber: Carnaval, 25 de Abril e Natal à 3ª, Corpo de Deus e Dia de Todos os Santos à 5ª. Mas já em 2006 o número de feriados nesses dias da semana tinha sido de 5. E em 2005 também. Aliás, desde 2000 tiveram todos 5 feriados à 3ª e à 5ª. Não tiveram estes 5 feriados nestes dias os anos 1999 e, antes desse, 1993 e 1988. Em verdade se diga que desde 1907 (de há 100 anos para cá) só 14 anos não tiveram 5 feriados à 3ª e 5ª. E nesses 14, o número de feriados “a convidar à ponte” foi de 4. Os feriados, ou são 5 (86 vezes) ou 4 (14 vezes). E o próximo ano só com 4 será 2010, e depois 2016, 2021, 2027, etc…

Então afinal onde está a grande excepção deste ano? Em lado nenhum.

E, como prometido, vamos ver como é “lá fora” de feriados: Alemanha – 13, Áustria – 17, Bélgica – 16, Dinamarca – 14, Espanha – 14, França – 14, Itália – 14, Luxemburgo – 12, Noruega – 17, Holanda – 10, Reino Unido – 11, Suécia – 19, Suíça – 19 e República Checa – 14.

Não estando listados todos os países da Europa ocidental ainda assim podemos dizer que só uma quinta parte deles tem menos feriados que nós.

Se pensarmos numa Suécia, com os seus 19 feriados e 35 dias de férias, temos que ter pena deles, porque por certo não vão endireitar a economia. Pobres suecos…

Mas a realidade é bem diferente. A realidade, que todos nós conhecemos, é a de que a Suécia é um dos países com melhores condições de vida. Se não mesmo o melhor.

Por isso, lamento “desencantar” aqueles que acusavam o ano de 2008 como sendo amigo dos preguiçosos. É afinal mais um ano normal, no que toca a feriados e possibilidades de pontes. Com a desvantagem numérica de ter mais um dia para trabalhar.

A esses que viam o número de dias de repouso garantidos pela lei como principal entrave ao desenvolvimento da nossa economia resta-me dizer que olhem para dentro. Ou talvez que olhem para fora, para a Suécia, e aprendam as diferenças entre as organizações de produção dos dois países. Aprendam e implementem as mudanças necessárias.

Por fim só esclarecer mais uma pequena confusão. Se o trabalhador quiser de facto fazer ponte nas 5 oportunidades que tem, será por certo a custas dos seus dias de férias. Essas pontes não são dias roubados à recuperação da economia, como se quer fazer crer. O que não vem, por isso mesmo, alterar as contas. A menos que o patrão, agora esclarecidas as coisas, ache que o empregado merece mais 5 dias de férias e adopte a tolerância de ponto nos enclaves laborais que vai ter o ano vindouro.

Recordando e resumindo: o ano de 2008 terá 366 dias, dos quais 226 são dias de trabalho. Os trabalhadores irão ter os mesmos 25 dias de férias. E haverá, como de costume, 52 fins-de-semana. E com 14 feriados nacionais, acrescidos de um municipal. Destes, 5 são oportunidades de ponte. Com a desvantagem para nós mortaguenses de o feriado municipal coincidir com o 1º de Maio.



publicado por Mário Lobo às 21:20
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